sexta-feira, 28 de maio de 2010

Como funciona a economia de hidrogênio

por Marshall Brain - traduzido por HowStuffWorks Brasil

Introdução

Abertura para o negócio
Em diversos países já existem postos de abastecimento de hidrogênio, entre eles Estados Unidos, Islândia, Japão e Alemanha. No Brasil, há um posto localizado no estado de São Paulo. Procure no site FuelCells.org por postos de abastecimento de hidrogênio em todo o mundo.
Todos os dias surge um novo anúncio na imprensa sobre carros equipados com células de combustível. As promessas são instigantes, pois as células de combustível possuem potencial para duplicar a eficiência dos carros e ao mesmo tempo reduzir a poluição de maneira significativa.

Enquanto isso, as histórias sobre problemas associados ao petróleo, relatadas nos noticiários, vêm acontecendo há décadas. Todo o tipo de acontecimento, desde vazamento de óleo, alertas sobre a quantidade de ozônio no ar e aquecimento global são conseqüências de nossa dependência dos combustíveis fósseis.

Estas duas influências estão conduzindo o mundo em direção ao que se conhece, de modo geral, por economia de hidrogênio. Se a previsão for verdadeira, dentro de algumas décadas as pessoas começarão a ver uma surpreendente alteração da economia de combustível fóssil para um futuro bem mais limpo com o hidrogênio.


Tubos de vapor na Wairakei Geothermal Generating Station (Estação Geradora Geotérmica de Wairakei)

A sociedade poderá realizar esta mudança ou as barreiras tecnológicas, econômicas e políticas continuarão nos amarrando ao petróleo? Neste artigo, você aprenderá os benefícios da economia do hidrogênio, juntamente com seus problemas potenciais. Também examinaremos algumas das tecnologias que tornariam a transição possível.

Os problemas da economia de combustível fóssil

Atualmente, os Estados Unidos e a maior parte do mundo está presa ao que se poderia chamar de economia de combustível fóssil. Nossos automóveis, trens, e aviões são abastecidos por produtos advindos do petróleo como a gasolina e o diesel. Uma grande porcentagem das usinas elétricas utiliza óleo, gás natural ou carvão para o abastecimento.

Se o fluxo de combustível fóssil para os Estados Unidos fosse interrompido em algum momento, a economia pararia, pois não haveria como transportar as mercadorias produzidas pelas fábricas. As pessoas não poderiam dirigir até o trabalho. Toda a economia mundial depende atualmente dos combustíveis fósseis.

Embora os combustíveis fósseis tenham exercido a importante função de ter conduzido a sociedade ao ponto em que se encontra, existem quatro grandes problemas que eles acarretam.

  • A poluição do ar - quando os carros queimam gasolina, a queima deveria ser feita de maneira ideal e produzir em seus sistemas de escape nada além de gás carbônico e água. Mas infelizmente, o mecanismo de combustão interna não é perfeito e o processo de combustão da gasolina também produz:
    • monóxido de carbono - um gás venenoso;
    • óxidos de nitrogênio - a principal fonte de poluição urbana;
    • hidrocarbonetos não queimados - a principal fonte de ozônio urbano.

    Os catalisadores eliminam a maior parte desta poluição, mas não são perfeitos. A poluição do ar, proveniente dos carros e das usinas elétricas, constitui um problema real nas grandes cidades.

    O fato negativo atualmente é que no verão, em muitas cidades, os níveis de ozônio no ar são altamente perigosos. Nas grandes cidades, nos invernos, principalmente com baixa umidade no ar, há também um fenômeno que amplia a poluição na atmosfera chamada de inversão térmica.

  • Poluição ambiental - a operação de transportar e armazenar o óleo causa um grande impacto ao ambiente no momento em que algo dá errado.


    O carregamento de óleo de um super petroleiro na Arábia Saudita

    O vazamento de óleo, a explosão de um oleoduto ou o incêndio de um poço de petróleo podem originar um grande caos. O vazamento da Exxon Valdez é o exemplo mais conhecido do problema, mas vazamentos em menores proporções acontecem com freqüência. No Brasil, a explosão da plataforma P-36 da Petrobras no Rio de Janeiro, em 2001, acabou causando mortes funcionário e vazamento de óleo na Baia da Guanabara.

  • Aquecimento global - ao queimar um galão ou 2,5 litros de gasolina, um veículo emite cerca de 2 kg de carbono, que são lançados na atmosfera. Se o carbono fosse uma substância sólida seria bastante perceptível, pois seria como jogar 2 kg de açúcar da janela do carro para cada galão de gás queimado. Mas como os 2 kg de carbono saem em forma de gás invisível (o dióxido de carbono - CO2), não conseguimos perceber isso. O dióxido de carbono que sai de cada escapamento de carro é um dos gases do efeito estufa que vem aumentando lentamente a temperatura do planeta. Os efeitos extremos são desconhecidos, mas existe uma grande possibilidade de que no futuro aconteçam mudanças climáticas de grandes proporções que afetarão todas as pessoas no planeta. Por exemplo, se a calota polar derreter, o nível do mar se elevará de maneira acentuada, inundando e destruindo as cidades litorâneas. Trata-se de um efeito colateral muito preocupante.

  • Dependência - os Estados Unidos e a maioria dos países são incapazes de produzir petróleo suficiente para satisfazer a demanda, por isso necessitam importar das nações que o produzem em maior quantidade. O fato gera uma dependência econômica. Quando os produtores do Oriente Médio decidem aumentar o preço do óleo, o restante do mundo não têm outra alternativa além de pagar.

As vantagens da economia do hidrogênio

Na seção anterior, vimos os importantes problemas gerados pelo uso de combustíveis fósseis. A economia de hidrogênio promete eliminar todos esses problemas. Abaixo alguns benefícios da economia de hidrogênio.
  1. A eliminação da poluição causada por combustíveis fósseis - quando se utiliza o hidrogênio em uma célula de combustível para gerar energia, a tecnologia empregada é inteiramente limpa, pois o único produto utilizado é a água. Também não existem perigos ao meio ambiente, como os vazamentos de óleo.

     

  2. A eliminação dos gases do efeito estufa - quando o hidrogênio provém da eletrólise (em inglês) da água, o processo não emana gases do efeito estufa ao meio ambiente. Então acontece um ciclo perfeito: a eletrólise produz hidrogênio a partir da água e esse se recombina com o oxigênio para gerar água e energia em uma célula de combustível.

     

  3. O fim da dependência econômica - a eliminação do óleo significa o fim da dependência econômica para com o Oriente Médio e suas reservas.

     

  4. Produção distribuída - pode-se produzir hidrogênio em qualquer lugar onde exista água e eletricidade. As pessoas podem até produzi-lo em casa com uma tecnologia relativamente simples.
Os problemas da economia de combustíveis fósseis são tantos e as vantagens da economia de hidrogênio tão significativas, que as circunstâncias impulsionam para esta última.

As dificuldades tecnológicas

Com relação à economia de hidrogênio, a grande pergunta é: de onde ela viria? Depois surgem dúvidas quanto ao transporte, a distribuição e a armazenagem. O hidrogênio tende a ser volumoso e delicado em sua forma natural e gasosa.

Assim que estas questões forem respondidas, a economia do hidrogênio poderá entrar em vigor.

Vamos dar uma olhada em cada uma destas questões separadamente nas próximas seções.

 

De onde vem o hidrogênio

Uma das maiores dificuldades da economia de hidrogênio é o próprio hidrogênio. De onde ele virá? Na economia de combustível fóssil, o mineral é bombeado do solo e depois é queimado como fonte de energia. Veja Como funciona a perfuração de petróleo e Como funciona o refino de petróleo.

A maioria das pessoas não reconhece o valor da gasolina, do carvão ou do gás natural, no entanto, eles são minerais surpreendentes. Esses combustíveis fósseis consistem em energia solar que foi armazenada há milhões de anos, tempo em que as plantas cresceram com o auxílio da energia solar. Depois morreram e com o tempo se transformaram em petróleo, carvão e gás natural. Ao bombear o petróleo do solo, estamos utilizando esse enorme depósito de energia solar "de graça". Toda vez que queimamos um galão de gasolina, essa energia solar armazenada é liberada.

Na economia de hidrogênio, não existe um depósito de energia solar a ser explorado. A energia na verdade deve ser produzida em tempo real. Existem duas fontes de hidrogênio em potencial.

  • Eletrólise da água - com a eletrólise, é fácil separar as moléculas de água e gerar hidrogênio e oxigênio puros. Uma grande vantagem desse processo é que ele pode ser realizado em qualquer lugar. Por exemplo, é possível produzir hidrogênio em uma caixa, na garagem de casa, usando água da torneira e usá-lo para abastecer o carro.

  • Melhorando o combustível fóssil - o petróleo e o gás natural contêm hidrocarbonetos, moléculas formadas por hidrogênio e carbono. Utilizando-se um dispositivo chamado processador de combustível ou um reformador, é possível separar de modo relativamente fácil o hidrogênio do carbono de um hidrocarboneto e depois utilizar o hidrogênio. O carbono que sobra é lançado na atmosfera como dióxido de carbono.
A segunda opção, naturalmente, é um tanto imprópria. Trata-se da utilização do combustível fóssil como fonte de hidrogênio para a economia de hidrogênio. Esta abordagem reduz a poluição do ar, mas não resolve nem o problema dos gases do efeito estufa, porque o carbono continua sendo lançado na atmosfera, nem o problema da dependência dos combustíveis fósseis, pois o petróleo é utilizado. No entanto, talvez seja um passo provisório positivo de transição para a economia do hidrogênio. Quando você ouve falar de veículos movidos a célula de combustível, sendo produzidos pelas empresas de automóvel, saiba que a maioria delas planeja conseguir o hidrogênio para as células a partir da gasolina, utilizando um reformador. Isto porque a gasolina é uma fonte de hidrogênio fácil de encontrar. Enquanto não houver postos de hidrogênio em cada esquina como os postos de gasolina, essa será a maneira mais fácil de obter hidrogênio e abastecer as células de combustível dos carros.

A primeira opção é interessante, pois consiste na essência da economia real de hidrogênio absoluta. Para se conseguir essa economia, o gás necessita derivar de fontes renováveis, ao invés de combustíveis fósseis, assim cessaremos de lançar CO2 na atmosfera. Obter energia suficiente para retirar o hidrogênio da água e gerar esta eletricidade sem a utilização de combustíveis fósseis será a maior mudança que ocorrerá com a economia de hidrogênio.


A Bayswater Power Station (Estação de Energia de Bayswater - New South Wales, Austrália) produz eletricidade por meio de vapor pressurizado para operar os turbogeradores

De onde virá a eletricidade para a eletrólise da água? Atualmente, cerca de 68% da eletricidade produzida nos Estados Unidos provêm do carvão ou do gás natural. Toda esta capacidade geradora terá que ser substituída por fontes renováveis na economia de hidrogênio. Além disso, toda a energia de combustíveis fósseis destinada ao transporte, carros, caminhões, trens, barcos, aviões terá que ser convertida em hidrogênio, o qual também será produzido com eletricidade. Em outras palavras, a capacidade de geração de energia no país terá que dobrar para suprir a demanda de transporte, para depois os combustíveis fósseis serem substituídos por fontes renováveis. Portanto, o fluxo de CO2 liberado na atmosfera será interrompido.

Existem diversas maneiras de se produzir eletricidade na atualidade, sem o uso de combustíveis fósseis:


No sentido horário, desde a parte superior direita: usina de energia solar, usina nuclear, usina hidrelétrica, usina de vento, turbina eólica

Nos Estados Unidos, atualmente cerca de 20% da energia é gerada de usina nuclear e 7% de usina hidrelétrica. A energia solar, a eólica, a geotermal e outras fontes produzem juntas somente 5% da energia, um número que está longe de ser significativo.

No futuro, a não ser que um grande avanço tecnológico aconteça, é bem provável que a capacidade de produção da energia nuclear ou da energia solar aumente de maneira considerável para a criação da economia de hidrogênio. Lembre-se de que, na economia de hidrogênio absoluta, a capacidade de produção de energia deverá quase que dobrar porque toda a energia elétrica utilizada para o transporte que, atualmente, advém do petróleo, terá que ser substituída pelo hidrogênio. Portanto, o número de usinas de energia duplicará e todos as usinas de combustível fóssil serão substituídas.

O problema da geração de energia elétrica consiste no maior obstáculo para a economia de hidrogênio. Logo que a tecnologia for aperfeiçoada e seu preço se tornar acessível, os veículos de célula de combustível movidos a hidrogênio poderão substituir os motores de combustão interna de gasolina no decorrer de uma ou duas décadas. Porém, converter as usinas de energia em usinas solares e nucleares pode ser complicado. A energia nuclear tem problemas políticos e ambientais, enquanto a energia solar possui atualmente dificuldades no que refere a custo e locação.

Como armazenar e transportar o hidrogênio

A grande dificuldade em se colocar carros movidos a hidrogênio puro nas ruas está na armazenagem e no transporte. O hidrogênio é um gás de grande volume que precisa ser comprimido e está longe de ser fácil de lidar como a gasolina. No entanto, as soluções para o problema de armazenagem do hidrogênio começam a aparecer.

Por exemplo, o hidrogênio pode ser armazenado em sua forma sólida, o chamado boroidreto, tecnologia que tem sido noticiada recentemente porque vem sendo testada pela Chrysler, empresa fabricante de automóveis. Essa substância química é formada por bórax (em inglês). Conforme o boroidreto libera o hidrogênio, volta a ser bórax, por isso ele pode ser reciclado.

Logo que o problema da armazenagem e da padronização forem solucionados, uma rede de postos de hidrogênio e uma infra-estrutura de transporte deverá se desenvolver ao seu redor. O principal obstáculo para que isto ocorra talvez seja o processo de ordenação tecnológica. Os postos não irão se expandir de maneira rápida, enquanto não houver uma tecnologia de armazenagem claramente dominante no mercado. Por exemplo, se todos os carros movidos a hidrogênio de todos os fabricantes usassem o boroidreto, uma rede de postos de hidrogênio se desenvolveria rapidamente. Contudo, se levarmos em conta a história, é bem pouco provável que esse tipo de padronização aconteça rapidamente.

Também pode acontecer um avanço tecnológico que mude rapidamente a situação. Por exemplo, caso alguém desenvolvesse uma bateria recarregável de baixo custo com alta capacidade e pouco tempo de recarga, os carros elétricos não necessitariam de células de combustível e o hidrogênio não precisaria ser transportado. Os carros seriam recarregados com o uso direto de eletricidade.

Perspectivas de futuro

Ouviremos cada vez mais sobre a economia de hidrogênio nos noticiários porque o interesse está cada vez maior. Os problemas ambientais da economia do combustível fóssil, junto com os avanços da tecnologia da célula de combustível permitirão que os primeiros passos sejam dados.

A etapa mais evidente será a comercialização de veículos movidos a célula de combustível. Apesar de que estes inicialmente utilizarão gasolina e reformadores, as células de combustível incorporam as duas principais melhorias sobre os motores de combustão interna:

  • são cerca de duas vezes mais eficientes
  • podem reduzir de maneira significativa a poluição do ar nas cidades
Os carros com células de combustíveis que utilizam gasolina são uma etapa de transição excelente devido a estes benefícios.

Fazer a transição para a economia real de hidrogênio será mais difícil. As estações geradoras de energia terão que fazer a transição para fontes de energias renováveis e os mercados deverão concordar com as formas de armazenagem e transporte do hidrogênio. Esses obstáculos provavelmente farão com que a transição para a economia de hidrogênio seja um processo demorado.

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